quarta-feira, 31 de janeiro de 2024

Cena II, do Ato I, de Frei Luís de Sousa

  Ato I - Cena II (Conversa entre Telmo e Madalena)

 O primeiro momento é caracterizado pelas profecias e agouros de Telmo, pela influência de Telmo sobre Maria, pela evolução dos sentimentos de Telmo relativamente a Maria, pelos pedidos de Madalena a Telmo e pela acusação de Telmo a Madalena.

 Telmo assume que, inicialmente, e como consequência do seu desagrado face ao casamento de Madalena com Manuel de Sousa Coutinho, não «podia ver» Maria. Esta foi, com o tempo e como resultado do seu carácter afável, ganhando a sua afeição, tornando-o um modelo e levando-o mesmo a sugerir que o seu amor pela jovem seria superior ao do próprio pai. Telmo antecipa ainda um futuro revelador da verdadeira dimensão da sua afeição por Maria.

 Na segunda parte, verifica-se uma mudança de atitude de Madalena, uma síntese do passado comum de Madalena e Telmo Pais, a justificação de Telmo para acreditar que D. João não morreu, presságios, a caracterização da relação de Telmo e Madalena e a decisão final de não voltarem a falar do assunto.

 Aquando da lembrança do passado comum de Madalena e Telmo, concretiza-se uma analepse.

 Remete-se ao casamento de Madalena com D. João de Portugal, ao desaparecimento de D. João na batalha de Alcácer Quibir, à assumição por parte de Telmo do papel paternal sobre Madalena, às tentativas fracassadas de encontrar D. João de Portugal, ao casamento de Madalena com Manuel de Sousa Coutinho e ao nascimento de Maria.

 O estado de espírito de Madalena vai sofrendo alterações ao longo desta conversa com Telmo:

  • "(com as lágrimas nos olhos)", quando fala de Maria;
  • "(quase ofendida)", quando Telmo parece duvidar da confiança, respeito e carinho que ela lhe devota;
  • "(sorrindo)" e "(rindo)", nomomento em que Telmo revela gostar mais de Maria do que os próprios pais;
  • "(assustada)", perante a armação agoirenta de Telmo;
  • "(... toma uma atitude grave e firme)",pretendendo retomar as rédeas da conversapara que ela não fuja para onde ela não quer. Num tom impositivo, lembra a natureza e alongevidade da sua relação e pede-lhe que não estimule a crença sebastianista em Maria;
  • "(aterrada)" e "(possuída de grande terror)", quando Telmo lhe lembra a carta de D. João, onde aquele arma que voltará vivo ou morto;
  • "(com afetação)", pois ela própria não acredita naquilo que está a dizer quando se refere aos membros da sua família como estando "seguros, em paz e felizes..."

 Depois de proferir "não sei latim como meu senhor..." Telmo reformula a frase para deixar claro que se refere a Manuel de Sousa Coutinho ("quero dizer como o Sr. Manuel de Sousa Coutinho"), a quem, por "ciúmes", e apesar de possuir nobres qualidades, não reconhece o valor do seu "amo", D. João de Portugal.

 Telmo acredita que seu amo não está morto por causa das palavras da carta que aquele escreveu a Madalena na madrugada da fatídica batalha.

 Segundo Telmo, Madalena nutria por D. João “respeito, devoção, lealdade”, mas não amor.

 Madalena lembra que a "dúvida" sobre a morte de D. Sebastião, possibilitando igual dúvida sobre a morte de D. João de Portugal, poderia "condenar a eterna desonra a mãe e a filha", tornando-se "fatal" para a família.

 Reconhecendo-se como responsável por tal hipótese, Telmo manifesta a sua "agitação" e mostra-se "aterrado".

 O "fantasma" referido é D. Sebastião e a "quimera" o sonho de que ele esteja vivo. Se isto viesse a ser verdade, poderia constituir uma desgraça para Madalena, pois D. João poderia também estar vivo.

 Decidem não voltar a falar nem do passado - assunto tão doloroso para ambos - nem do futuro.

 O primeiro aparte de Telmo ("Terá...") revela ao espetador/leitor as dúvidas da personagem em relação à morte de seu amo, D. João de Portugal, e reiteram a sua fé no seu regresso.

 O segundo anuncia, desde logo, a impossibilidade de salvar Maria, por muitos esforços que Telmo venha a fazer nesse sentido.

 As constantes interrupções das falas de Madalena, representadas pelas reticências, mostram as suas hesitações, os seus medos, o seu terror de falar do seu passado, como que temendo que, ao falar dele, ele possa voltar.

 A última dala de Madalena dá-nos informações acerca da situação política que se vivia em Portugal. Madalena está preocupada com a demora do marido. As razões dessa preocupação são a peste, ainda existente em Lisboa, e o ambiente social e político de agitação face à ocupação espanhola, em particular, considerando o "carácter inflexível" de Manuel de Sousa Coutinho.

Caracterização das personagens

 D. Madalena:

  • Mulher de condição nobre;
  • Casou a primeira vez com D. João de Portugal, quando ainda era "uma criança";
  • Hoje tem uma filha com Manuel deSousa Coutinho;
  • É uma personagem dada a superstições e agoiros, vivendo sempre com medo de que algo de mau possa acontecer e, por isso, não é capaz de usufruir da felicidade do presente. Vive angustiada relativamente ao passado.

Telmo:

  • Foi aio de D. João de Portugal e acredita que ele está vivo e há de regressar;
  • É, agora, aio de Maria, que, de alguma forma, veio tomar o lugar do seu antigo amo, e tem uma grande influência sobre ela.
  • Tem, em relação a Madalena, algum ressentimento, pois sabe que ela nunca amou verdadeiramente D. João de Portugal, chegando mesmo a sentir, em relação à mesma, os ciúmes que seu antigo amo não teve.

Manuel de Sousa é um fidalgo com quem casou depois de D. João ter desaparecido na batalha de Alcácer Quibir e de o ter procurado, em vão, durante sete anos.

Maria, uma jovem frágil e doente que é fonte de grandes preocupações.

Texto integral

Frei Luís de Sousa

Frei Luís de Sousa

Representado, a primeira vez, em Lisboa por uma sociedade particular no Teatro da Quinta do Pinheiro em 4 de julho de 1843

Pessoas

Manuel (Frei Luís) de Sousa
Dona Madalena de Vilhena
Dona Maria de Noronha
Frei Jorge Coutinho
O Romeiro
Telmo Pais
O Prior de Benfica
Miranda
O Arcebispo de Lisboa 
Doroteia
O Irmão Converso
Coro de frades de S. Domingos, Clérigos do Arcebispo, frades, criados, etc.

Lugar da cena - Almada

Ato Primeiro

 Câmara antiga, ornada com todo o luxo e caprichosa elegância portuguesa dos princípios do século dezassete. Porcelanas, charões, sedas, flores, etc. No fundo, duas grandes janelas rasgadas, dando para um eirado que olha sobre o Tejo e donde se vê toda Lisboa; entre as janelas o retrato, em corpo inteiro, de um cavaleiro moço, vestido de preto, com a cruz branca de noviço de S. João de Jerusalém. Defronte e para a boca da cena um bufete pequeno, coberto de rico pano de veludo verde franjado de prata; sobre o bufete alguns livros, obras de tapeçaria meias feitas e um vaso da China de colo alto, com flores. Algumas cadeiras antigas, tamboretes rasos, contadores. Da direita do espectador, porta de comunicação para o interior da casa, outra da esquerda para o exterior. É no fim da tarde.

Cena I

 Madalena só, sentada junto à banca, os pés sobre uma grande almofada, um livro aberto no regaço, e as mãos cruzadas sobre ele, como quem descaiu da leitura na meditação.

 Madalena (repetindo maquinalmente e devagar o que acaba de ler).

Naquele engano d'alma ledo e cedo,
que a fortuna não deixa durar muito...

Com paz e alegria dalma.. um engano, um engano de poucos instantes que seja... deve de ser a felicidade suprema neste mundo. E que importa que o não deixe durar muito a fortuna? Viveu-se, pode-se morrer. Mas eu!... (Pausa). Oh! que o não saiba ele ao menos, que não suspeite o estado em que eu vivo... este medo, estes continuos terrores, que ainda me não deixaram gozar um só momento de toda a imensa felicidade que me dava o seu amor. Oh! que amor, que felicidade... que desgraça a minha! (Torna a descair em profunda meditação; silêncio breve).

Análise da Cena I

Cena II

Madelena, Telmo Pais

 Telmo (chegando ao pé de Madalena, que o não sentiu entrar) - A minha senhora está a ler?...

 Madalena (despertando) - Ah! sois vós, Telmo... Não, já não leio: há pouca luz de dia já; confundia-me a vista. E é um bonito livro este! o teu valido, aquele nosso livro, Telmo.

 Telmo (deitando-lhe os olhos) - Oh! oh!, livro para damas - e para cavaleiros... e para todos: um livro que serve para todos - como não há outro, tirante o respeito devido ao da palavra de Deus! Mas esse não tenho eu a consolação de ler, que não sei latim como meu senhor... quero dizer como o Sr. Manuel de Sousa Coutinho - que, lá isso!... acabado escolar é ele. E assim foi seu pai antes dele, que muito bem o conheci: grande homem! Muitas letras, e de muito galante prática, e não somenos as outras partes de cavaleiro: uma gravidade!... Já não há daquela gente. Mas, minha senhora, isto de a palavra de Deus estar assim noutra língua, numa língua que a gente... que toda a gente não entende... confesso-vos que aquele mercador inglês da Rua Nova, que aqui vem às vezes, tem-me dito suas cousas que me quadram... E Deus me perdoe, que eu creio que o homem é herege, desta seita nova d’Alemanha ou d’lnglaterra. Será?

 Madalena - Olhai, Telmo; eu não vos quero dar conselhos: bem sabeis que desde o tempo que... que...

 Telmo - Que já lá vai, que era outro tempo.

 Madalena - Pois sim... (suspira). Eu era uma criança; pouco maior era que Maria.

 Telmo - Não, a senhora D. Maria já é mais alta. 

 Madalena - É verdade, tem crescido de mais, e de repente, nestes dous meses últimos...

 Telmo - Então! Tem treze anos feitos, é quase uma senhora, está uma senhora... (aparte). Uma senhora aquela... pobre menina!

 Madalena (com as lágrimas nos olhos) - És muito amigo dela, Telmo?

 Telmo - Se sou! Um anjo como aquele... uma viveza, um espírito!... e então que coração!

 Madalena - Filha da minha alma! (Pausa; mudando de tom). Mas olha, meu Telmo, torno a dizer-to: eu não sei como hei-de fazer para te dar conselhos. Conheci-te de tão criança, de quando casei a... a... a... primeira vez, costumei-me a olhar para ti com tal respeito - já então eras o que hoje és, o escudeiro valido, o familiar quase parente, o amigo velho e provado de teus amos...

 Telmo (enternecido) - Não digais mais, senhora, não me lembreis de tudo o que eu era.

 Madalena (quase ofendida) - Porquê? Não és hoje o mesmo, ou mais ainda, se é possível? Quitaram-te alguma coisa da confiança, do respeito, do amor e carinho a que estava costumado o aio fiel de meu senhor D. João de Portugal, que Deus tenha em glória? 

 Telmo (aparte) - Terá...

 Madalena - O amigo e camarada antigo de seu pai?

 Telmo - Não, minha senhora, não, por certo.

 Madalena - Então?...

 Telmo - Nada. Continuai, dizei, minha senhora.

 Madalena - Pois está bem. Digo que mal sei dar-vos conselhos, e não queria dar-vos ordens... Mas, meu amigo, tu tomaste - e com muito gosto meu e de seu pai - um ascendente no espírito de Maria... tal que não ouve, não crê, não sabe senão o que lhe dizes. Quase que és tu a sua dona, a sua aia de criação. Parece-me... eu sei... não fales com ela desse modo, nessas coisas.

 Telmo - O quê? No que me disse o inglês sobre a Sagrada Escritura, que eles lá têm em sua língua, e que?...

 Madalena - Sim... nisso decerto... e em tantas outras coisas tão altas, tão fora de sua idade, e muitas de seu sexo também, que aquela criança está sempre a querer saber, a perguntar. É a minha única filha; não tenho... nunca tivemos outra... e, além de tudo o mais, bem vês que não é uma criança... muito... muito forte.

 Telmo - É... delgadinha, é. Háde enrijar. É tê-la por aqui, fora daqueles ares apestados de Lisboa; e deixai, que se há de pôr outra.

 Madalena - Filha do meu coração!

 Telmo - E do meu. Pois não se lembra, minha senhora, que ao princípio era uma criança que eu não podia... - é verdade, não a podia ver: já sabereis porquê mas vê-la, era ver... Deus me perdoe!... nem eu sei... E daí começou-me a crescer, a olhar para mim com aqueles olhos... a fazer-me tais meiguices, e a fazer-se-me um anjo tal de formosura e de bondade, que - vedes-me aqui agora, que lhe quero mais do que seu pai.

 Madalena (sorrindo) - Isso agora...

 Telmo - Do que vós.

 Madalena - Ora, meu Telmo!

 Telmo - Mais, muito mais. E veremos: tenho cá uma coisa que me diz que, antes de muito, se há de ver quem é que quer mais à nossa menina nesta casa.

 Madalena (assustada) - Está bom; não entremos com os teus agouros e profecias do costume: são sempre de aterrar... Deixemo-nos de futuros...

 Telmo - Deixemo-nos, que não são bons.

 Madalena - E de passados também...

 Telmo - Também. 

 Madalena - E vamos ao que importa agora. Maria tem uma compreensão...

 Telmo - Compreende tudo!

 Madalena - Mais do que convém.

 Telmo - Às vezes.

 Madalena - É preciso moderá-la.

 Telmo - É o que eu faço.

 Madalena - Não lhe dizer...

 Telmo - Não lhe digo nada que não possa, que não deva saber uma donzela honesta e digna de melhor... de melhor...

 Madalena - Melhor quê?

 Telmo - De nascer em melhor estado. Quisestes ouvi-lo... está dito.

 Madalena - Oh, Telmo! Deus te perdoe o mal que me fazes. (Desata a chorar).

 Telmo (ajoelhando e beijando-lhe a mão) - Senhora… senhora D. Madalena, minha ama, minha senhora… castigai-me… mandai-me já castigar, mandai-me cortar esta língua perra que não toma insino… Oh! senhora, senhora! é vossa filha, é a filha do senhor Manuel de Sousa Coutinho, fidalgo de tanto primor e de tão bom linhagem como os que se têm por melhores neste reino, em toda a Espanha. A senhora D. Maria… a minha querida D. Maria é sangue de Vilhenas e de Sousas; não precisa mais nada, mais nada, minha senhora, para ser... para ser...

 Madalena - Calai-vos, calai-vos, pelas dores de Jesus Cristo, homem.

 Telmo (soluçando) — Minha rica senhora!...

 Madalena (enxuga os olhos e toma uma atitude grave e firme) - Levantai-vos, Telmo, e ouvi-me. (Telmo levanta-se). Ouvi-me com atenção. É a primeira vez e será a última vez que vos falo deste modo e em tal assunto. Vós fostes o aio e o amigo de meu senhor... de meu primeiro marido, o senhor D. João de Portugal; tínheis sido o companheiro de trabalhos e de glória de seu ilustre pai, aquele nobre conde de Vimioso, que eu de tamanhinha me acostumei a reverenciar como pai. Entrei depois nesta família de tanto respeito; achei-vos parte dela, e quase que vos tomei a mesma amizade que aos outros... Chegastes a alcançar um poder no meu espírito, quase maior... - decerto maior que nenhum deles. O que sabeis da vida e do mundo, o que tendes adquirido na conversação dos homens e dos livros - porém, mais que tudo, o que de vosso coração fui vendo e admirando cada vez mais - me fizeram ter-vos numa conta, deixar-vos tomar, entregar-vos eu mesma tal autoridade nesta casa e sobre minha pessoa... que outros poderão estranhar...

 Telmo - Emendai-o, senhora.

 Madalena - Não, Telmo, não preciso nem quero emendá-lo. Mas agora deixai-me falar. Depois que fiquei só, depois daquela funesta jornada de África que me deixou viúva, órfã e sem ninguém... sem ninguém, e numa idade... com dezassete anos! - em vós, Telmo, em vós só achei o carinho e protecção, o amparo que eu precisava. Ficastes-me em lugar de pai; e eu... salvo numa coisa! - tenho sido para vós, tenho-vos obedecido como filha.

 Telmo - Oh, minha senhora, minha senhora! mas essa coisa em que vos apartastes dos meus conselhos...

 Madalena - Para essa houve poder maior que as minhas forças... D. João ficou naquela batalha com seu pai, com a flor da nossa gente. (Sinal de impaciência em Telmo). Sabeis como chorei a sua perda, como respeitei a sua memória, como durante sete anos, incrédula a tantas provas e testimunhos da sua morte, o fiz procurar por essas costas de Berberia, por todas as sejanas de Fez e Marrocos, por todos quantos aduares de Alarves aí houve... Cabedais e valimento, tudo se empregou; gastaram-se grossas quantias; os embaixadores de Portugal e Castela tiveram ordens apertadas de o buscar por toda a parte; aos padres da Redenção, a quanto religioso ou mercador podia penetrar naquelas terras, a todos se encomendava o seguir a pista do mais leve indício que pudesse desmentir, pôr em dúvida ao menos aquela notícia que logo viera com as primeiras novas da batalha d’Alcácer. Tudo inútil; e a ninguém mais ficou resto de dúvida...

 Telmo - Senão a mim.

 Madalena - Dúvida de fiel servidor, esperança de leal amigo, meu bom Telmo, que diz com vosso coração, mas que tem atormentado o meu... E então sem nenhum fundamento, sem o mais leve indício... Pois dizei-me em consciência, dizei-mo de uma vez, claro e desinganado: a que se apega esta vossa credulidade de sete... e hoje mais catorze... vinte e um anos?

 Telmo (gravemente) — Às palavras, às formais palavras daquela carta, escrita na própria madrugada do dia da batalha, e entregue a Frei Jorge, que vo-la trouxe. - «Vivo ou morto» - rezava ela - vivo ou morto... Não me esqueceu uma letra daquelas palavras; e eu sei que homem era meu amo para as escrever em vão: - «vivo ou morto, Madalena, hei de ver-vos pelo menos ainda uma vez neste mundo». - Não era assim que dizia?

 Madalena (aterrada) - Era.

 Telmo - Vivo não veio... inda mal! E morto... a sua alma, a sua figura...

 Madalena (possuída de grande terror) - Jesus, homem!

 Telmo - Não vos apareceu de certo.

 Madalena - Não; credo!

 Telmo (misterioso) - Bem sei que não. Queria-vos muito; e a sua primeira visita, como de razão, seria para minha senhora. Mas não se ia sem aparecer também ao seu aio velho.

 Madalena - Valha-me Deus, Telmo! Conheço que desarrazoais; e contudo as vossas palavras metem-me medo... Não me façais mais desgraçada.

 Telmo - Desgraçada! Porquê? Não sois feliz na companhia do homem que amais, nos braços do homem a quem sempre quisestes mais sobre todos? Que o pobre de meu amo... respeito, devoção, lealdade, tudo lhe tivestes, como tão nobre e honrada senhora que sois... mas amor!

 Madalena - Não está em nós dá-lo, nem quitá-lo, amigo.

 Telmo - Assim é. Mas os ciúmes que meu amo não teve nunca - bem sabeis que têmpera d’alma era aquela - tenho-os eu... aqui está a verdade nua e crua... tenho-os eu por ele. Não posso, não posso ver... e desejo, quero, forcejo por me acostumar... mas não posso. Manuel de Sousa... o Senhor Manuel de Sousa Coutinho é um guapo cavalheiro, honrado fidalgo, bom português... mas - mas não é, nunca há de ser aquele espelho de cavalaria e gentileza, aquela flor dos bons... Ah, meu nobre, meu santo amo!

 Madalena - Pois sim, tereis razão... tendes razão, será tudo como dizeis. Mas refleti, que haveis cabedal de inteligência para muito; eu resolvi-me por fim a casar com Manuel de Sousa; foi do aprazimento geral de nossas famílias, da própria família de meu primeiro marido, que bem sabeis quanto me estima; vivemos (com afectação) seguros, em paz e felizes… há catorze anos. Temos esta filha, esta querida Maria, que é todo o gosto e ânsia da nossa vida. Abençoou-nos Deus na formosura, no engenho, nos dotes admiráveis daquele anjo.. E tu, tu, meu Telmo, que és tão seu que chegas a pretender ter-lhe mais amor que nós mesmos...

 Telmo - Não, não tenho!

 Madalena - Pois tens: melhor! E és tu o que andas continuamente e quase por acinte a sustentar essa quimera, a levantar esse fantasma, cuja sombra, a mais remota, bastaria para enodoar a pureza daquela inocente, para condenar a eterna desonra a mãe e a filha!... (Telmo dá sinais de grande agitação). Ora dize: já pensaste bem no mal que estás fazendo? Eu bem sei que a ninguém neste mundo, senão a mim, falas em tais cousas... falas assim como hoje temos falado... mas as tuas palavras misteriosas, as tuas alusões frequentes a esse desgraçado rei D. Sebastião, que o seu mais desgraçado povo ainda não quis acreditar que morresse, por quem ainda espera em sua leal incredulidade, - esses contínuos agouros, em que andas sempre, de uma desgraça que está iminente sobre a nossa família... não vês que estás excitando com tudo isso a curiosidade daquela criança, aguçando-lhe o espírito - já tão perspicaz! - a imaginar, a descobrir... quem sabe se a acreditar nessa prodigiosa desgraça, em que tu mesmo... tu mesmo... sim, não crês deveras? Não crês, mas achas não sei que doloroso prazer em ter sempre viva e suspensa essa dúvida fatal. E então considera, vê: se um terror semelhante chega a entrar naquela alma, quem lho há de tirar nunca mais? O que há de ser dela e de nós? Não a perdes, não a matas... não me matas a minha filha?

 Telmo (em grande agitacão durante a fala precedente, fica pensativo e aterrado; fala depois como para si) - É verdade que sim! A morte era certa. E não há de morrer: não, não, não, três vezes não. (Para Madalena). À fé de escudeiro honrado, senhora D. Madalena, a minha boca não se abre mais; e o meu espírito há de... há de fechar-se também... (aparte). Não é possível, mas eu hei de salvar o meu anjo do céu! (Alto para Madalena). Está dito, minha senhora.

 Madalena - Ora Deus to pague. Hoje é o último dia de nossa vida que se fala em tal.

 Telmo - O último.

 Madalena - Ora pois, ide, ide ver o que ela faz (levantando-se): que não esteja a ler ainda, a estudar sempre. (Telmo vai a sair). E olhai: chegai-me depois ali a S. Paulo, ou mandai, se não podeis...

 Telmo - Ao convento dos domínicos? Pois não posso!… quatro passadas.

 Madalena - E dizei a meu cunhado, a Frei Jorge Coutinho, que me está dando cuidado a demora de meu marido em Lisboa; que me prometeu de vir antes de véspera e não veio; que é quase noite, e que já não estou contente com a tardança. (Chega à varanda e olha para o rio). O ar está sereno, o mar tão quieto, e a tarde tão linda... quase que não há vento, é uma viração que afaga... Oh! e quantas faluas navegando tão garridas por esse Tejo! Talvez nalguma delas - naquela tão bonita - venha Manuel de Sousa. Mas neste tempo não há que fiar no Tejo: dum instante para o outro levanta-se uma nortada... e então aqui o pontal de Cacilhas! Que ele é tão bom mareante... Ora, um cavaleiro de Malta! (Olha para o retrato com amor). Não é isso o que me dá maior cuidado; mas em Lisboa ainda há peste, ainda não estão limpos os ares… e essoutros ares que por aí correm destas alterações públicas, destas malquerenças entre castelhanos e portugueses! Aquele carácter inflexível de Manuel de Sousa traz-me num susto contínuo. Vai, vai a Frei Jorge, que diga se sabe alguma coisa, que me assossegue, se puder.

Análise da Cena II

Cena I, do Ato I de Frei Luís de Sousa

 Ato I - Cena I (Monólogo de Madalena)

 O espaço onde decorre o Ato I é colorido, iluminado pela luz que entra por amplas janelas viradas para o Tejo e luxuosamente decorado. Tem duas portas de comunicação que permitem a ligação com o exterior.

 Contribui para caracterizar as personagens que aí se movimentam pois, simbolicamente, é um espaço amplo, de liberdade e felicidade (a desgraça ainda não se abateu sobre esta família).

 Está presente um retrato de grande importância na sala, o de Manuel, marido de Madalena.

 Este espaço permite concluir que se trata da casa de uma família com um elevado estatuto social e económico, um espaço social ligado à nobreza.

 Nesta cena, Madalena encontra-se sozinha, enquanto lê a passagem de Inês de Castro n'Os Lusíadas. Madelana compara-se a Inês. Ambas partilham a experiência de um grande amor, porém Inês teve paz e alegria, ao passo que Madalena vive em constante desassossego.

 O “este medo” e os “contínuos terrores” que a perseguem (note-se a gradação crescente) não lhe permitiram, ainda que vivesse, usufruir da felicidade que o seu amor lhe poderia proporcionar, levando-a, no final da cena, a desabafar esse conflito interior pelo uso da antítese: «...que felicidade…que desgraça a minha!».

 O caráter trágico do episódio de Inês de castro, determinado pelo destino (fortuna), constitui o primeiro indício de que ação se encaminhará inevitavelmente para a catástrofe.

 Madalena sente-se predestinada à morte, tal como Inês: «Viveu-se, pode-se morrer».

 Assim, Madalena surge em cena duplamente marcada pelo destino:

  • pelo simbolismo do espisódio de Inês de Castro;
  • pelo prenúncio de um sebastianismo que só lhe poderá ser adverso.

 O facto de Garrett ter colocado Madalena a ler Os Lusíadas propicia a segunda fala de Telmo (cena II), que considera este livro «como não há outro, tirante o respeito devido ao da palavra de Deus», que não conhece por não saber latim como o seu «senhor».

Texto integral

segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

Mitos sobre a economia de mercado

Guião para apresentação de economia

PowerPoint em anexo

Mitos sobre a economia de mercado


1º Mito - "A economia de mercado cria pobreza e desigualdade".

(Slide)

 Nós podemos colocar o início da economia de mercado como conhecicemos hoje no começo da Revolução Industrial. Quando a produção em massa,... A verdade é que desde a Revolução Industrial, a percentagem de pessoas no mundo a viver em pobreza extrema diminuiu brutalmente. 

(Slide)

 E este feito é particularmente notável, porque esta foi uma altura em que a população aumentou drasticamente. Ou seja, diminuiu-se a percentagem de pessoas a viver em pobreza extrema enquanto nós, seres humanos, estamos a sobrelotar este planeta.

(Slide)

Nós, no princípio do século XIX, o estado normal do Homem era a pobreza extrema. Era alguém que não sabia no princípio do ano não saber se iria sobreviver até ao final. Esse era o estado normal das pessoas. Corria algo mal com as colheitas. Havia uma guerra. Havia um problema qualquer. Era uma luta permanente pela sobrevivência. Chegar aos 40 ou 50 anos era um feito.

 (Aponta para o slide). Temos aqui um gráfico da distribuição dos rendimentos em 1800. Temos aqui a linha da pobreza. Quase toda a gente estava para trás.

 Ser rico, nesta altura, era viver minimamente pobre. Estamos a falar duma altura muito tardia da história da humaninade. Desde que o ser humano existe, isto é já quase no fim. Milhares de anos que passaram desde a existência do ser humano e tudo o que coseguimos foi ter a esmagadora maioria a morrer de fome.

 (Slide)

 A economia de mercado mudou isto.

 O que é que aconteceu. A economia de mercado e a Revolução Industrial foram duas políticas adotadas principalmente em zonas mais desenvolvidadas: Europa e América do Norte. Então, o que aconteceu nos 150 anos a seguir à adoção destas políticas? 

 O mundo ramificou-se em dois. (Aponta para os continentes pobres) O mundo que continuava aqui atrás (Ásia, África,...) onde isto não chegou. Este parte é basicamente igual aos séculos passados.

 E derrepente passamos a ter uma parte da população aqui. Ser pobre na Europa (apontar para o início da curva amarela) não era necessariamente estar na pobreza extrema. As pessoas passaram a ter a certeza que, neste ano, independentemente daquilo que acontecesse, a sua aldeia não iria morrer de fome.

 Essa mudança foi trazida pela a economia de mercado, a Revolução Industrial e a produção em massa. Foi acabar com a obreza extrema.

 Por isso é que os países que não adotaram, ou adotaram mais tarde, continuaram neste estado lastimável. Mas eles aperceberam-se disso. E foi por esta altura que adotaram as medidas.

 (Slide)

 E derrepente passamos a ter uma curva de distribuição de rendimentos uniforme, mas à frente da linha da pobreza extrema. Deixamos de ter as "bossas do camelo", como o The Economist chama, e temos apenas uma curva. Eu sei que não é o que parece, consoante o que os média mostram, mas, comparado à cem anos atrás, o meu está muito menos pobre.

 (Slide)

 O segundo mito é que este sistema económico cria muito bilionários. Ainda há esta mentalidade de que só existe um bolo e se existirem muitos milionários é porque alguém tem de passa fome. É precisamente o oposto.

 É verdade que existem mais milionários e bilionários, mas não significa que existem mais pobres. Antes pelo contrário. Aquilo que leva muitos a enriquecer é a massificação de riqueza, a massificação de produção que ajuda a que existam menos pobres.

 Há uma questão que normalmente é esquecida quando se fala nisto, que é a alteração das implicações de ser pobre. Isto tornou diferente aquilo que é uma distribuição de rendimentos desigual. Isto é mais fácil de demonstrar por imagens. Hoje, a diferença de estilo de vida entre alguém que é pobre e alguém que é milionário é menor do que há cem ou há duzentos anos.

 (Pelas vossas caras, não sei se estão a acreditarar naquilo que eu estou a dizer, mas vou vos mostrar.).

 (Slide)

 O que é que acontecia antes:

 Mobilidade 

Antes da ecconomia de mercado: a pessoa andava a pé

Algúem no topo da hierarquia: tinha o seu cavalo com motorista.

(Slide)

 O que acontece hoje:

 Uma pessoa comum tem um carro de 5000€

 E um milionário tem um de 400.000€

 Custa 80 vezes mais. Retiram ali 80 vezes mais de utilidade?

 Ou seja, a diferença entre andar a pé e ter uma corroça de cavalo era muito maior do que entre ter um Alfa Romeu Mito dum 8C.

 Nota-se que há uma diferença de rendimentos. Este deve ganhar muito mais do que aquele, mas a diferença de utilidade daquilo que o rendimento pode atingir é muito baixa. 

 Este pode ir de Lisboa ao Algarve em hora e meia. Este vai numa, mas depois terá uma carta da polícia em casa.

 (Slide)

 Vestuário:

 Pobres usavam a mesma roupa quase todo o ano e andavam descalços.

 Isto era a realidade antes da produção em massa.

 Um milionário usava roupa mais fantasiosa

 (Slide)

 Nos dias de hoje, umas caças de ganga e uma t-shirt.

 Estas devem ter custado muito mais, mas têm a mesma utilidade que aquela. E até a mesma aparência.

 (Slide)

 Habitação.

 Um pobre dormia numa cama de palha. Um milionário vivia no seu castelo.

 (Slide)

 Esta casa com ginásio e piscina na melhor zona da cidade pode custar um milhão de euros. Este apartamento ali ao pé da adega da vila custa 150.

 Há diferenças na utilidade, sim. Mas não comparem isto com a diferença entre viver numa barraca e viver num castelo.

 (Slide)

 Alimentação:

 A pessoa comum comia o que apanhava. Passava dias sem comer. O milionário tinha sempre um banquete 

 (Slide)

 Nos dias de hoje, a pessoa comum tem uma alimentação bastante variada, por cinco euros. Já o milionário come um pedaço de lavagante.

 Hoje questionamos quem ficava mais bem servido. Isto custar cinquenta vezes mais que isto. Mas duvido que alguém questione se esta pessoa fica cinquenta vezes mais bem servida.

 Isto sou eu a ser mau e a dar-vos fome.

 (Slide)

 Entretenimento:

 A pessoa comum ia à missa. Ira o que havia.

 O milionário ia à ópera, via torneios,... Até tinha bobo da corte.

 (Slide)

 Hoje em dia? Quase diferença nenhuma. Se preguntarmos a um milionário como se entretém, tenho a certeza que será da mesma forma que a pessoa comum.

 A economia de mercado, a massificação de riquesas e produção lideraram a uma muito menor diferença do estilo de vida um milionário com a pessoa comum. Não só se eliminou a pobreza, como se reduziu bastante a desiguldade. 

(Slide)

Agora mudando de cenário.


2º Mito - "A Economia de mercado é má para o ambiente".

 É verdade que o crescimento económico pode, de facto, causar danos no ambiente. O crescimento económico e a massificação podem efetivamente causar dano e alguns irreversíveis.

 Agora, há uma alternativa a isto, que é não haver crescimento económico nem produção. A pobreza é verde, não haja dúvidas!

(Slide)

Coloquei este exemplo. A Coreia do Norte, muito ambientalista, há noite não consome eletricidade nenhuma. Ótimo! Pegada de carbono muito pequena, sem dúvida.

 Já a Coreia do Sul, sacanas! Ali a prejudicar o ambiente. Mas qualquer outro sistema que não seja uma economia de mercado causa, se produzir o mesmo, muita mais poluição.

 O que faz poluir o ambiente é o extrativismo, que é quando uma unidade produtiva usa recursos ambientais sem garantir que sejam substituídos.

 Uma das premissas mais repetidas pelos ambientalistas é a que devemos de reduzir o nosso consumo.

 A Greta deixou de comer carne, usar papel, comprar roupa,...

 Ouviram e ouvirão que deixar de consumir é a solução, mas este argumento é totalmente falso!

 Se houver uma redução no consumo, irá, consequentemente, reduzir-se a produção, o que criaria desemprego e falta de poder de compra. Estes fariam o consumo reduzir-se ainda mais, e entraríamos num ciclo vicioso que originaria uma pobreza imaginável.

 Quem também seria prejudicado é o Estado, e as verbas destinadas a causas ambientais iriam desaparecer. Lá está, mais importante do que reduzir a pegada ecológica, é haver produtos para satisfazer as nossas necessidades, como alimentação, vestuário, saúde, entre outras.

 A escola tem uma nova medida que limita o número de fotocópias que os professores podem fazer para poupar papel e, assim, salvar árvores. Isto resultaria no Brasil. Isto resultaria no Congo. Se nestes países, onde reina o extrativismo, ou seja, por cada resma de papel que consumamos uma árvore será cortada, mas que não vai ser replantada, esta medida era benéfica.

 Mas em Portugal é exatamente ao contrário! Se nós queremos ter florestas bem cuidadas, temos de garantir que elas são economicamente aproveitáveis. Em Portugal, consumir uma resma de papel é aquilo que garante que haja mais árvores. Porquê? Porque para produzir uma resma de papel, alguém tem de plantar essas árvores.

(Slide)

(Examinar a notícia)

(Slide)

 Então o que tem acontecido? Qual é a tendência atual? A degradação ambiental tende a seguir a Curva de Kuznets, ou seja, no princípio do desenvolvimento económico começa-se, efetivamente, a degradar o ambiente, mas quando se chega a um certo nível de desenvolvimento económico, essa degradação começa inverter-se, sendo a produção cada vez mais sustentável.

 (Slide)

 Isto não é só uma questão teórica. Fizeram-se análise a diversos países, em que, de facto, as emissões de CO2 cresceram bastante num período inicial, mas agora estão a baixar em todos os países europeus. A Europa e a América do Norte foram os únicos continentes cujos países viram a sua área florestal aumentar nos últimos vinte anos.

 Para que a produção seja cada vez mais sustentável, precisaremos de tecnologias que nos permitam continuar a crescer, mas utilizando menos recursos ambientais. A inovação, apoiada pela Agenda 2030, pretende reduzir o desperdício. Faz com que sejam precisos menos objetos para satisfazer a nossas necessidades. 

 (Slide)

 Qualquer um de nós tem um telemóvel, que substituiu muitos objetos que poderíamos ter neste momento. A inovação faz com que se aproveitem melhor os recursos ambientais. Produz-se mais, utilizando menos matérias-primas.

 Este tema é importantíssimo e o esforço que a União Europeia está a fazer para sermos mais sustentáveis é de louvar. Podemos estar otimistas.

 Espero que tenham gostado desta apresntação e que não vos tenha massado muito. Obrigado!


quarta-feira, 10 de janeiro de 2024

As áreas urbanas

 Denomina-se área urbana o espaço de elevada concentração populacional, habitacional e de serviços, podem ter uma dimensão variável.

 Já área rural é a zona com características próprias da prática agrícola, de grande dispersão populacional e habitacional.

 Urbanização é as alterações a níveis espaciais, demográficos e económicos que surgem em resultado do processo de transformação do meio rural em urbano, devido à atração e concentração populacional.

 Urbanização é as alterações a níveis espaciais, demográficos e económicos que surgem em resultado do processo de transformação do meio rural em urbano, devido à atração e concentração populacional.

A urbanização expressa-se através da taxa de urbanização (Tu).

É a relação entre a população urbana e a população total

Tu = Pu/Pt * 100

 As cidades concentram têm grande densidade populacional, grande concentração de atividades dos setores terciário e secundário, paisagens têm traços vincados de urbanidade e vários equipamentos e serviços sociais, como hospitais, serviços administrativos, centros comerciais.

 A evolução da urbanização, nos países desenvolvidos, acompanhou a Revolução Industrial, com um crescimento gradual e linear ao desenvolvimento do país, o que originou uma elevada urbanização atual, devido à modernização da agricultura e do desenvolvimento do comercio e serviços.

 Nos países em desenvolvimento, houve um crescimento muito rápido e crescente, originado pela alta natalidade e pelo grande êxodo rural que as guerras e a destruição do solo provocaram.

 Em 1800, existiam 2 cidades com 1 milhão de habitantes (Londres e Pequim);

 Em 1900, Londres tinha 6,5 milhões;

 Em 1996, havia 16 cidades com mais de 10 milhões de habitantes;

 Em julho de 2011, 26 cidades tinham maid de 10 milhões de habitantes.

 As cidades têm como principais problemas a/o(s):

  • falta de habitação;
  • áreas residenciais degradadas;
  • falta de equipamento social básico;
  • congestionamentos;
  • falta de estacionamentos;
  • transportes públicos insuficientes;
  • poluição atmosférica;
  • falha na recolha do lixo;
  • problemas sociais.

 Em Portugal, o crescimento urbano é muito acentuado no litoral (litoralização), porém, está ainda mais acentuado em Lisboa e no Porto (bipolarização).

 Em 1972, existiam 39 cidades. Em 2013, 159.

Critérios para definir uma cidade

 1. Demográficos

 População absoluta - A cidade é definida por um número mínimo de habitantes.

 🟢 - Simples e fácil na aplicação.

 🔴 - Grande disparidade de valores e o mesmo valor tem significados diferentes para países industria-lizados e países em vias de desenvolvimento.

 Densidade populacional - A cidade é definida por um número mínimo de habitantes por quilómetro quadrado.

 🟢 - Simples e fácil na aplicação.

 🔴 - Impossível universalização do critério devido às disparidades entre países desenvolvidos e em de-senvolvimento.

 2. Funcionais

 A cidade é definida por uma percentagem máxima de população ocupada nos sector primário

 🔴 - Não há uma percentagem universal, no Terceiro Mundo e há cidades com mais de 50% da popu-lação na agricultura.

 3. Critérios conjugados

 A cidade é definida pela conjunção dos critérios demográfico e funcional.

 Segundo a Conferência Europeia de Estatística (Praga, 1966), é cidade qualquer aglomeração com mais de 10000 habitantes ou tendo um mínimo de 2000, mas que a população ligada ao setor primário não ultrapasse os 25%.

 4. Outros critérios

 Pode-se considerar cidade uma localidade com passado histórico, como Pinhel, jurídico-administrativa ou com uma morfologia única.

 Em Portugal, uma cidade é definida por um número mínimo de habitantes e um conjunto de serviços oferecidos à população.

ARTIGO 13.º 

Uma vila só pode ser elevada à categoria de cidade quando conte com um número de eleitores, em aglomerado populacional contínuo, superior a 8000 e possua, pelo menos, metade dos seguintes equipamentos colectivos: 

a) Instalações hospitalares com serviço de permanência; 

b) Farmácias; 

c) Corporação de bombeiros; 

d) Casa de espectáculos e centro cultural; 

e) Museu e biblioteca; 

f) Instalações de hotelaria; 

g) Estabelecimento de ensino preparatório e secundário; 

h) Estabelecimento de ensino pré-primário e infantários; 

i) Transportes públicos, urbanos e suburbanos; 

j) Parques ou jardins públicos. 

ARTIGO 14.º 

Importantes razões de natureza histórica, cultural e arquitectónica poderão justificar uma ponderação diferente dos requisitos enumerados nos artigos 12.º e 13.º

 (Texto retirado do Diário da República, Lei nº11/82 de 2 de Junho)

 Qualquer que seja o critério usado, todas as cidades, na sua diversidade, têm traços em comum:

  • Densa concentração humana;
  • Concentração de atividades económicas dos setores secundário e terciário;
  • Existência de equipamento social, cultural e recreativo;
  • Elevados fluxos de pessoas e trânsito.

 O crescimento urbano tem dois aspetos fundamentais: o demográfico e o espacial.

 Tipos de concentrações urbanas

 Metrópole - grande cidade, com pelo menos meio milhão de habitantes, incluindo subúrbios, resultando dum só núcleo. São exemplos o Porto e Lisboa.

 Conurbação - junção de duas ou mais metrópoles. São exemplos Amesterdão, Haia e Roterdão.

 Megalópolis - concentração de diversas metrópoles e/ou conurbações e subúrbios. Temos como exemplo Tóquio.

 Cada cidade tem características próprias. Diversos fatores permitem que se agrupem em tipos, conforme a análise que se fizer.

 Os fatores que as destinguem são o/a(s):

  • clima;
  • espaço disponível;
  • vias de comunicação;
  • história e cultura;
  • antiguidade;
  • desenvolvimento económico;
  • densidade populacional;
  • função exercida;
  • origem;
  • tipo de planta.
 Podemos agrupar as cidades em:
  • europeia;
  • norte-americana;
  • latino-americana;
  • mulçumana africana;
  • negra africana;
  • asiática;
  • socialista (ex-URSS).

 As cidades podem ser planeadas, se criadas de raiz, ou adaptadas, que vão evoluindo lentamente à medida do desenvolvimento das sociedades.

 As cidades destinguem-se pela sua planta, que pode ser irregular, radioconcêntrica ou ortogonal.

 Planta irregular

  • Resulta do crescimento espontâneo ao longo do tempo;
  • Ruas desordenadas, de traçado sinuoso e caótico;
  • Não há organização do espaço (ordenação ou planificação).
  • 🟢 Adapta-se à topografia acidentada;
  • 🟢 Promove relações entre a vizinhança;
  • 🟢 Reduz a utilização dos meios de transporte e facilita percursos a pé.
  • 🔴 Dificulta a mobilidade e acesso a viaturas;
  • 🔴 Dificulata a segurança pública;
  • 🔴 Grande número de obstáculos.

 Planta radioconcêntrica

  • Resulta do crescimento da cidade a partir de uma posição defensiva ou de um planeamento deliberado;
  • Organização a partie dum centro ou praça;
  • Ruas que partem do centro para a periferia (radiais);
  • Ruas que cortam as ruas radias (concêntricas);
  • Nas cidades planeadas à uma hierarquia entre as ruas.
  • 🟢 Facilita o acesso direto ao centro da cidade;
  • 🟢 Adapta-se à topografia acidentada;
  • 🟢 Deslocações entre o centro e a periferia rápidas;
  • 🟢 Define a hierarquia dos espaços.
  • 🔴 Dificulta a construção nos quarteirões mais próximos do centro.

 Planta ortogonal

  • Traçado retilíneo de todas as ruas;
  • Conjunto de ruas paralelas e perpendiculares entre si;
  • As ruas têm uma hierarquia entre si;
  • Resultam sempre dum planeamento prévio. 
  • 🟢 Facilita a circulação longitudinal dos transportes;
  • 🟢 Adapta-se à necessidade de crescimento da cidade;
  • 🟢 Permite a construção de grandes edifícios;
  • 🟢 Facilita a segurança pública.
  • 🔴 Dificulta a fluidez do transito (grande número de cruzamentos);
  • 🔴 A disposição das ruas facilita a circulação do ae em velocidade;
  • 🔴 Os trajetos tornam-se mais longos em deslocações em ângulo reto;
  • 🔴 Não se adapta com facilidade a terrenos acidentados.

 A cidade contém diversas áreas com características próprias, onde predomina uma função.

 A primeira e principal função da cidade é a função residencial. É a que lhe dá origem.

 Também temos o CBD, as áreas industriais e os subúrbios.

 A organização das áreas funcionais depende da renda locativa, isto é, o preço do solo. Esta varia com a distância ao centro e a acessíbilidade. É tanto maior quanto mais perto do centro, porque o custo de transporte é mais baixo.

 A procura do centro da cidade superior à oferta conduz a um desiquilíbrio da curva da oferta e da procura.

 O preço do solo é influenciado por outros fatores dentro da cidade, como condições ambientais, aspetos socias e a organização administrativa.

 CBD ou centro ou baixa

  • Zona central e mais importante da cidade;
  • Forte concentração de comércio e serviços;
  • Fraca função residencial: só classes baixas e idosos;
  • Grande tráfego diúrno de pessoas e veículos;
  • Escasso movimento noturno;
  • Diferenciação vertical da ocupação dos edifícios;
  • Elevada poluição sonora e atmosférica;
  • Pode coincidir com o núcleo histórico - sítio.
 O centro é a área da cidade que mais evoluiu:
  1. Exclusivamente residencial, comercial e administrativa;
  2. Dominado pela indústrial durante a Revolução Industrial;
  3. Descentralização das funções para as novas áreas da cidade.
 Esta evolução, causada pelo grande crescimento da cidade, congestionamento do centro e altos preços da habitação, originou novas zonas nas periferias da cidade, de grande acessibilidade e com um conjunto complementar de serviços.

 Áreas residenciais

  • Maior espaço da cidade;
  • É a essencia da cidade;
  • Domina a função habitacional;
  • Divide-se em bairoos e zonas sociais diferentes.

 Classes altas

  • Áreas planeadas;
  • Boa acessibilidade;
  • Espaços verdes;
  • Vistas panorâmicas;
  • Zonas de prestígio;
  • Predominam vivendas e condomínios fechados;
  • Proximidade de serviços e comércio sofisticado.

 Classe médias

  • Menor qualidade arquitetónica;
  • Maior parte do espaço urbano;
  • Bons serviços de transporte;
  • Boa acessibilidade;
  • Área em expanção;
  • Predominam moradias e apartamentos espaçosos;
  • Proximidade de serviços de apoio e comércio;
  • Predomina a população jovem com mobilidade própria.

 Áreas industriais

 Esta evoluiu com a cidade:
  1. Inicialmente, no centro ou na residência do artesão;
  2. No centro, durante a Revolução Industrial;
  3. Na periferia, depois da Primeira Guerra Mundial.
 Fatores de relocalização da indústria:

  • Elevados custos do solo;
  • Necessidade de espaço;
  • Congestionamentos;
  • Poluição;
  • Desenvolvimento dos transportes.
 Ainda se encontram pequenas indústria no centro, porque exigem pouco espaço, poucas matérias-primas, pouca energia e produzem bens raros e caros.

 Subúrbios:

  • Zonas de crescimento recente;
  • Zonas de fácil acesso;
  • Equipamentos que necessitam de muito espaço;
  • Parques industriais;
  • Bairros de classe.

 As cidades estabelecem relações com o meio envolvente. A cidade fornece bens e serviços e adquire produtos alimentares. Quanto mais raro for o bem ou serviço, mais forte é a área de influência da cidade.

 Bens vulgares - produtos e serviço de utilização frequente e que podem ser encontrados facilmente.

 Bens raros - produtos e serviço de utilização pouco frequente.

 Bens dispersos - produtos e serviço de distribuição domiciliária.

 Bens centrais - produtos e serviço que apenas existem num lugar central.

 Quanto maior o número de funções raras oferecidas, maior a importância da cidade.

 Todas as cidades concentram funções. Nalgumas, uma ou duas funções tornam-se dominantes, passando a caracterizar a cidade.

 As funções são político-administrativa, comercial, industrial, defensiva, portuária,, educativa, hospitalar, culural, religiosa e turística.

 Quando a principal função da cidade deixa de ser importante, ou a cidade se adapta, ou desaparece.

 A expansão urbana ocorre de duas formas: em altura ou em extensão.

 A fase centrífuga está diretamente relacionada com a industrialização após  a II Guerra Mundial e foi possibilitada pelo desenvolvimento dos transportes. Carateriza-se pela implantação de novas áreas residenciais na periferia, ao longo dos eixos de acesso à cidade Progressiva ocupação do espaço rural.

 Cidades satélite resultam da expansão do núcleo populacional rural à categoria de cidade. Possuem vida própria e assumem-se como polos de atração.

 Cidades dormitório  resultam, por vezes, da expansão do núcleo populacional rural à categoria de cidade. Possuem escassos equipamentos, infraestruturas e atividade económica.

 Suburbanização é a alteração do espaço rural, que, progressivamente, se descaracteriza, perdendo os seus traços, assumindo características mistas entre o rural e o urbano.

 Rurbanização é o fenómeno em que o espaço rural ganha população, atividades e funções próprias de cidade, mantendo a população ligada à exploração da terra.

 São impactos negativos da expansão urbana o/a(s):

  • Intensificação dos movimentos pendulares;
  • Pressão dos transportes;
  • Poluição atmosférica;
  • Aumento das despesas, fadiga e tensão, devido às deslocações no quotidiano;
  • Crescentes despesas públicas com a instalação de redes de abastecimento de água, eletricidade e saneamento;
  • Deficiente uso de serviços;
  • Ocupação dos solos agrícolas e florestais;
  • Decadência da atividade agrícola.

 As áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto foram criadas em 1991. Os concelhos têm perdido população, mas os concelhos circundantes têm ganho.

 Área metropolitana é o espaço constituído por uma grande cidade e uma área envolvente, marcada por relações de dependência muito fortes.

 A AM de Lisboa contém 27% da população nacional. Já a do Porto, 16%.

 As AM têm um grande dinamismo demográfico. Elevada concentração populacional, que tem aumentado na coroa exterior, com uma população jovem e qualificada.

 Também existe um dinamismo económico. Há uma bipolarização das atividades económicas, correspondendo a 40% do emprego nacional, com salários superiores à média.

 A AM de Lisboa deu origem aos concelhos dormitórios, concelhos em que menos de 35% da população trabalha localmente.

Instrumentos legais de planeamento duma cidade:

  • Plano Municipal de Ordenamento de território (PMOT);
  • Plano Diretor Municipal (PDM);
  • Planos de Urbanização (PU);
  • Planos de Pormenor (PP).

 Programas de requalificação urbana:
  • POLIS;
  • PROSIURB.

 Programas de reabilitação urbana:
  • PRAUD;
  • RECRIA;
  • REHABITA;
  • RECRIPH;
  • SOLARH.

quarta-feira, 3 de janeiro de 2024

Sustainable Development and Eco-Tourism

 Ecotourism is a form of tourism that focuses on the exploration and appreciation of nature, with an emphasis on conservation, preservation and environmental sustainability.

 Just because tourism is nature-based, it doesn't mean to say it's necessarily responsible or sustainable. So, there's a lot of animal activities in tourism that we know which are highly irresponsible and unsustainable, like swimming with dolphins, elephant-riding, tiger selfies where the tigers are drugged.

 Genuine ecotourism is sustainable – designed to continue at a steady level which does not damage the environment.

 There are two requirements travel companies should meet to qualify as genuine ecotourism. First, tourists’ main motivation should be to appreciate and observe the natural world without interfering, and second, the money they spend should support traditional communities. Clearly, having your photograph taken with a chained and drugged tiger does not meet these requirements.

 Tourism is essential to boost the economic development of local communities. Tourism stimulates local entrepreneurship, as residents can create specialized services to meet the needs of visitors, create jobs, encourage the redevelopment of abandoned properties, lead to the improvement of infrastructure, facilitate cultural exchange between visitors and the local community and encourage environmental conservation.

 When companies are dependent on a natural resource, it is obvious that they intend to preserve it. Without the environment, there is no income.

 It is also important to note that the revenue generated by ecotourism can be directed to conservation projects, such as reforestation, protection of natural habitats and environmental monitoring programs.

 Ecotourism is also crucial in raising visitors' awareness of local ecological issues.

 We can exemplify with Tajikistan, which gets less than two dozen wildlife tourists a year, and the money these visitors bring is essential to the conservation work that  NGOs are doing. So those few tourists… their money goes a very long way and the animals people are looking at are being observed from a distance, their behaviour is not being affected in any way, and the local communities are genuinely benefiting.

Valor modal

Modalidade epistémica de certeza O sol nasce todos os dias. Modalidade epistémica de probabilidade Pode sair Camões no exame. Modalidade deô...